Liberdade para quem?

Aprovada pela Câmara dos Deputados como Projeto de Lei de Conversão nº 17/2019, a MP 881 é uma ironia cruel por se declarar uma proposta de “Liberdade Econômica”. O governo diz querer reduzir a burocracia para os negócios da iniciativa privada, ao estabelecer garantias para o livre mercado e prever isenção de alvarás e licenças para startups, entre outras medidas. A proposição também estabelece alterações na Consolidação das Leis do Trabalho e permite o trabalho aos domingos, com folga a cada quatro semanas, sem aval do sindicato por acordo coletivo.

“Em março deste ano, o governo publicou uma Medida Provisória para interferir na forma de financiamento das organizações sindicais (a MP 873). Logo depois, editou um texto que dá liberdades econômicas à iniciativa privada, como isenção de alvarás e de licenças de funcionamento. Com isso, nos perguntamos: liberdade para quem? Enquanto iniciativa privada ganha benefícios alarmantes, os sindicatos permanecem sobre intensa vigilância. Por que o governo é permissivo com empresas privadas, mas vigilante sobre organizações sociais e sindicais? Isso é preocupante para o nosso Estado Democrático”, argumenta Luís Cláudio de Santana, Secretário de Imprensa e Comunicação da Condsef/Fenadsef.

A MP 873 caducou no Congresso Nacional, mas seu texto foi reapresentado em forma de Projeto de Lei do Senado, assinado pela senadora Soraya Thronicke (PSL-MS). O PL 3.814/19 propõe mais uma vez alterar a CLT para dispor sobre a contribuição sindical e proibir o desconto em folha do servidor associado, previamente autorizado. Luís Cláudio repudia a iniciativa e classifica a proposta como antissindical. A proposta se encontra atualmente na Comissão de Assuntos Sociais e aguarda relatoria do senador Paulo Paim (PT-RS).

Gravidades

Entidades representantes de órgãos trabalhistas posicionaram-se contra a MP da “Liberdade Econômica” e alertaram a população sobre os perigos contidos no texto, em nota de repúdio assinada pela Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho (ANPT), Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho (Sinait) e Associação Brasileira de Advogados Trabalhistas (Abrat).

A nota técnica conjunta denuncia a inconstitucionalidade da submissão de valores e princípios protetivos de trabalhadores à supremacia dos interesses econômicos, por ferir artigo (3º, I) que determina como objetivo da República “construir uma sociedade livre, justa e solidária”. Outra inconstitucionalidade do texto reside na instituição de contrato de trabalho subordinado não sujeito à legislação trabalhista, destituindo o empregado de qualquer proteção.

Outro ponto preocupante diz respeito ao afrouxamento do Sistema Federal de Inspeção do Trabalho, ou seja, ao exigir a presença de advogado para recebimento de autuação administrativa, o PL, se transformado em lei, inviabiliza toda e qualquer autuação em flagrante de delito (inclusive os graves delitos de trânsito) ou ilícito administrativo e trabalhista, esvaziando o poder de polícia da Inspeção do Trabalho como um legítimo instrumento de concretização dos direitos e interesses coletivos em matéria de trabalho.

Além disso, a fiscalização, quando ocorrer, será realizada preferencialmente por trabalhadores terceirizados, desmontando um setor importante de atuação de servidores públicos efetivos, dotados de estabilidade para resistir às pressões governamentais e econômicas em seu ofício. Para Luís Cláudio, este é mais um ataque do governo contra os servidores públicos.

Críticas

Em audiência na Comissão de Direitos Humanos do Senado (CDH), na última terça-feira, 13, especialistas criticaram a MP. A diretora legislativa da Anamatra, Viviane Maria Leite de Faria, disse entender que o texto viola a Constituição de 1988 por buscar suprimir direitos. Ela também considera ilegais os termos da medida que excluem da proteção laboral os trabalhadores que recebem mais do que 30 salários mínimos. Outros debatedores apontaram que a MP está, na verdade, fazendo uma nova reforma trabalhista.

Presidente da Comissão, senador Paulo Paim, declarou que a medida retira direito dos trabalhadores, especialmente do trabalhador rural, que poderá atuar em situação análoga à escravidão, submetido a uma jornada exaustiva e sem limites, tendo-se em vista que a MP permite, em período de safra, o trabalho aos sábados, domingos e feriados, sem a folga correspondente ao longo da semana.

A proposta tem validade até 27 de agosto e é o primeiro item da pauta do Plenário desta terça-feira, 20.

(Com informações da Agência Senado)